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đŸ’–đŸŽ¶đŸŽ” MĂŁe, como Ă© grande o meu Amor por VocĂȘ!

 MĂŁe,

NĂŁo hĂĄ um Ășnico dia em que teu nome nĂŁo se revele dentro de mim — nĂŁo no pensamento mecĂąnico, mas naquele canto secreto onde sĂł as coisas eternas sabem morar. Teu nome, mĂŁe, me visita como quem retorna ao lar. E, mesmo quando o mundo me grita pressa, hĂĄ sempre um intervalo em que eu te escuto em silĂȘncio. Como uma canção que a alma conhece antes de aprender.

Tua presença estĂĄ em mim como semente antiga. Silenciosa, mas viva. VocĂȘ floresce na forma como encaro a vida — no modo como afasto a poeira dos sentimentos, como ajeito a alma nos dias em que ela nĂŁo quer caber em mim. Tuas memĂłrias de infĂąncia, que guardava com tantos ensinmentos, sĂŁo meu relicĂĄrio invisĂ­vel. Um legado que nĂŁo pesa, mas sustenta. Força vestida de leveza. Sabedoria bordada em doçura.

VocĂȘ nĂŁo me ensinou sĂł a manter uma casa em ordem ou reconhecer merecimento nos detalhes. VocĂȘ me embalou quando o mundo me deixou cair. Acolheu meus silĂȘncios, os rancores que eu nem sabia nomear. Me ensinou que toda dor carrega em si uma providĂȘncia — que nada chega Ă  nossa porta sem trazer um recado do cĂ©u. E que, Ă s vezes, a fĂ© Ă© sĂł continuar, mesmo quando a alma se cansa.

Tua fĂ©, mĂŁe, era sagrada e simples. A ĂĄgua que escorria das tuas mĂŁos se tornava bĂȘnção. E tua oração — aquela que eu ouvia no quarto ao lado, entre palavras e suspiros — era ponte. Um gesto de amor entre mundos. E eu, que fui filha da tua fĂ©, aprendi que resistir nĂŁo Ă© endurecer. É manter o coração firme sem perder a ternura.

Mas como dĂłi... Como dĂłi a tua ausĂȘncia. HĂĄ uma dor que mora no silĂȘncio de nĂŁo mais ouvir tua voz. Uma ausĂȘncia que aperta nos lugares onde antes havia abraço. O tempo, esse senhor distraĂ­do, levou dias que eu queria de volta. Palavras que guardei por dizer. Gestos que nĂŁo fiz a tempo. Mas, mesmo na falta, tua presença Ă© farol. InvisĂ­vel, mas inteiro. Um tipo de amor que nĂŁo some — apenas muda de roupa.

E entĂŁo eu te sinto. Nos detalhes que ninguĂ©m vĂȘ. No cheiro de cafĂ©, no som do vento, na lĂĄgrima que cai sem razĂŁo. Tua presença me atravessa como intuição, como aviso, como abraço que nĂŁo precisa de corpo para existir. E Ă© assim que sigo. Com tua luz acesa dentro de mim. Porque tudo em mim se transforma, mas vocĂȘ permanece.

Hoje, cada vez que escuto alguĂ©m com paciĂȘncia, que acolho com o coração aberto, Ă© vocĂȘ, mĂŁe, quem estĂĄ ali. Em cada escuta que ofereço, em cada afeto que reparto, Ă© o teu amor que age. E mesmo sem teu corpo por perto, tua alma vive nos meus gestos. O que eu sou, Ă© espelho do que vocĂȘ me ensinou a ser.

Caminho, mesmo quando o chĂŁo arde. Porque sei que tua força me embala. Teus ensinamentos me protegem. E tua fĂ© ainda me guia. Sigo com tua memĂłria nos bolinhos de pĂŁo que tento repetir, na forma como olho minha filha, nas risadas que deixo escapar sem motivo — porque era isso que te iluminava: a capacidade de ver leveza onde o mundo pesava.

O que vocĂȘ foi para Maria Laura, eu tento ser para a Manu como tia. VocĂȘ nĂŁo viveu esse tempo com ela, mas deixou em mim um mapa. Um pedido sussurrado: continue. Continue o que eu comecei. E eu continuo, mĂŁe. Faço por por ela, por todas nĂłs. Faço porque aprendi contigo que amar Ă© se doar atĂ© o Ășltimo fio de si mesma, sem esperar nada alĂ©m do milagre de ver o outro florescer.

VocĂȘ me ensinou a ser mulher — nĂŁo qualquer mulher, mas uma mulher que sente o mundo e nĂŁo recua. Que enfrenta com sensibilidade, que ora enquanto luta. VocĂȘ me ensinou o tempo. O tempo de perder, o tempo de reencontrar, o tempo de nĂŁo entender, mas aceitar. O tempo de sentir, mesmo sem resposta. O tempo de amar sem precisar explicar.

Ah, mĂŁe... como Ă© grande o meu amor por vocĂȘ. Como ele cresce, mesmo na tua ausĂȘncia. Como ele Ă© inteiro, mesmo partido. VocĂȘ Ă© a linguagem secreta que pulsa no meu peito. O cĂłdigo sagrado que sĂł minha alma reconhece. A prece mais Ă­ntima que, mesmo sem ser dita, Ă© ouvida.

Bendita seja nossa histĂłria. Bendita seja tua passagem. Bendita sou eu por ter sido tua filha.

E sigo. Com tua luz em mim.
Com teu nome escrito em tudo o que ainda estĂĄ por vir e que merecemos aprender.





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